Afinal, o que é design?

Há quem associe design com uma “arte visual”, com esse artigo pretendo expor o que os designers fazem, como o seu potencial pode ser explorado dentro dos projetos e – espero – apresentar uma nova visão de design ao leitor, mas duas coisas podem ficar claras desde já:

  • Não entendo o design como arte
  • Não entendo o design como visual

Claro que muitas vezes nossa realidade justamente vê o design como ‘deixar algo bonitinho’ ou ‘a galera das artes’ nas empresas, e faz parte, é a realidade se sobrepondo a teoria. Nesse texto pretendo explorar uma visão um pouco mais idealizada da coisa, mas que tem se tornado uma ferramenta poderosíssima para os negócios do século XXI. Convido a reflexão de como essa visão mais profunda e ‘teórica’ até certo nível pode melhorar o seu contexto.

Design é, antes de tudo, projeto. Muitos autores inclusive defendem que o design nasce como área do conhecimento justamente na revolução industrial quando as fábricas dividiram as atividades projetuais da produção.

Como toda prática projetual o design tem (ou deveria ter) objetivos muito claros do que pretende alcançar – diferentemente da arte. E, idealmente, está preocupado em solucionar os problemas do usuário daquele projeto, ou seja, só interessa se a solução é “bonita” se isso for relevante ao usuário. Nesse sentido, o design não é visual, no máximo, possui soluções visuais.

Mas afinal, o que é design?

Algumas vezes vejo definições como “o design é solucionar problemas”, o que não está tecnicamente errado, mas acredito ser uma definição um pouco rasa. Quando olhamos mais a fundo para que tipo de problemas os designers estão solucionando rapidamente algumas questões interessantes começam a surgir.

Como um exercício de humildade temos que entender que designers não estão solucionando todos os problemas, se esse fosse o caso todos os projetos poderiam ser resolvidos somente por designers, entretanto, a realidade que vemos são equipes com engenheiros, contadores, administradores, gestores, vendedores, etc. Todas essas profissões estão preocupadas em resolver problemas no seu próprio escopo, então, que tipo de problema os designers estão solucionando?

Designers estão solucionando os problemas dos usuários.

O designer é treinado para ver o projeto a partir do ponto de vista do usuário, isso é, para um projeto existir ele precisa que alguém utilize o que está sendo projetado. Aí fica fácil entender porquê muitas vezes o designer se vê como um “solucionador de problemas”, para nós o problema mais importante é sempre o de quem vai usufruir do projeto.

Como resultado o designer fica em um meio-termo entre as áreas ‘técnicas’ e os stakeholders, buscando sempre resolver as necessidades dos usuários da melhor forma possível dado os requisitos de engenharia e atendendo os interesses do negócio, nos dando uma visão – modéstia a parte – bastante completa da prática projetual.

gráfico ilustrando as relações entre o negócio, a engenharia e o usuário com o design

Como o designer vê o projeto

O que significa ‘solucionar os problemas dos usuários?’

Nos aprofundando um pouco mais, uma possível interpretação da causa final do design é “criar ou aprimorar [algo] que torne a vida mais fácil para quem o utiliza.”

Essa definição é propositalmente aberta, pois todo projeto possui muitas variáveis, das quais acredito que três se destacam no resultado final, que podemos utilizar para entender melhor sempre que vamos analisar um projeto de design, são essas variáveis:

  • A visão de mundo do designer, como ele vê o impacto do seu projeto no mundo que o cerca
  • A forma final do projeto, o que é projetado?
  • Para quem está sendo projetado, a quem se deseja tornar a vida mais fácil?

O essencial é entender o projeto design como responsável pela otimização do produto ou serviço para o usuário final. Nesse sentido o design e a engenharia se aproximam, pois enquanto uma está preocupada na otimização de mecanismos, algoritmos, circuitos, etc. o outro está preocupado na otimização para seres humanos.

É justamente por essa visão ‘humanizada’ que o design dá aos projetos que essa área tem se tornado cada vez mais essencial aos negócios, se o usuário pode escolher entre:

  • Produto A, que resolve um problema
  • Produto B que resolve o mesmo problema, mas de uma forma mais fácil e que coloca menos empecilhos para isso

Muito provavelmente esse usuário irá escolher o produto B, o design é um diferencial competitivo. E não sou eu dizendo isso, autores da economia propuseram o que chamaram de ‘economia da experiência’ em 1998.

Gráfico proposto por Pine & Gilmore em 1998 demonstrando o uso da experiência como um diferencial competitivo

Gráfico proposto por Pine e Gilmore em 1998

Na economia da experiência o que conta não é somente o produto ou serviço entregue, mas também a forma com que o usuário tem contato com esses projetos e criam memórias, ou seja, é importante que quem utiliza o projeto tenha momentos agradáveis – ou no mínimo menos traumáticos – com o que se deseja oferecer.

Outro aprendizado muito interessante desse gráfico é o quanto ele se aproxima de como os designers atuaram ao longo do tempo, isso é, primeiramente criando materiais, depois pensando em serviços inteiros e atualmente focando cada vez mais em promover boas experiências. Mas com tudo isso em mente, onde um designer pode atuar?

Onde atuam?

Todo projeto que tem usuários possui design, seja ele intencional ou não, mas onde os designers atuam é em grande parte definido pelo contexto histórico. Com o passar do tempo a área foi se desenvolvendo e agregando novos projetos onde se é mais comum ter designers, uma generalização possível desses projetos seria:

  • Produtos
  • Materiais Gráficos 
  • Moda
  • Marcas
  • Interfaces
  • Serviços
  • Experiências

Mas novamente, todo projeto possui um usuário, e, portanto, design.

Historiadores da área defendem que com o tempo a ‘materialidade’ dos projetos tem se tornado cada vez menos relevante nos projetos de design, e aí passa a valer mais justamente a experiência, a interatividade e a usabilidade dos produtos, o que conversa muito com a nossa realidade, em que cada vez temos uma proximidade maior com telas e menos com o ‘mundo físico’ propriamente dito.

Pessoalmente acredito que o contato maior com telas gera sim uma preocupação maior com esses fatores, mas isso se deve também a um amadurecimento do entendimento do valor do design pela sociedade e um aprofundamento maior dos designers de como fazer o melhor projeto possível, ou seja, o que significa fazer algo mais ‘fácil ou agradável’. Um exemplo é que esses conceitos têm sido incorporados a todos os projetos de design, não somente quando pensamos em serviços ou interfaces, mas cada vez mais equipes de marketing e do design gráfico se preocupam com a criação de personas para criação de conteúdo e mídias visuais mais personalizadas, ou seja, que criem experiências melhores.

No fim das contas onde o designer irá atuar depende muito da cultura do ambiente de trabalho, no design estratégico se fala muito hoje em dia em ‘níveis de maturidade’ da área dentro das organizações – pretendo elaborar mais sobre isso em um texto futuro -, mas que em resumo é possível ter uma cultura de design que vai desde ‘deixar as coisas bonitinhas’ até decisões importantíssimas de negócio sendo tomadas levando em consideração o interesse dos usuários.

Claro que esse é um processo gradual e para que o design se torne mais importante para o negócio como um todo é preciso antes que os designers se levem a sério, estudando, pesquisando e apresentando dados concretos que comprovem o valor que ‘um desenho’ pode ter para melhorar as vendas, aumentar o engajamento com a marca e, sempre em primeiro lugar melhorar a vida das pessoas.

Mais conteúdos

Para finalizar quero deixar algumas dicas de conteúdos que se aprofundam no tema e que são referências pessoais do meu pensamento sobre o design:

  • Esse vídeo recente do Atila Iamarino comentando sobre a importância do design.
  • Documentário da BBC ‘Genius of Design’, disponível no Youtube nesse link.
  • Esse artigo e muitos outros do Nielsen Norman Group.
  • O livro ‘O Design do dia a dia’ de Donald Norman (o mesmo que o Atila cita no vídeo acima).
  • O livro ‘Uma introdução à história do design’ do Rafael Cardoso.

Acho importante ressaltar que essas são as minhas visões sobre o tema, com certeza há estudiosos muito mais capacitados que discordariam de mim em algum nível, o design é uma área em constante mudança e como toda boa ciência humana há muito debate, mesmo com mais de dois séculos de história enquanto algumas coisas se solidificam mais no imaginário popular outras portas vão se abrindo para novas definições e atuações do design, a quem interessar sinta-se a vontade para entrar em contato, adoraria conversar mais sobre isso e ter minhas visões confrontadas. Pretendo colocar em algum momento um espaço para comentários aqui também por esse mesmo motivo, mas até lá aguardo o contato 🙂.